quarta-feira, 12 de março de 2014
Ipanema, Copacabana lembram coisas dos anos cinquenta/sessenta, Bossa Nova, Vinicius, Nara Leão. A ascensão da cidade para um nível de ícone sem igual. A cidade maravilhosa por excelência - seja ainda mais excelente o Leblon ou a Barra da Tijuca, que meu amigo diz se comparar mais a Cascais - sendo Copacabana e Ipanema comparáveis ao Estoril Português. Hoje concentramo-nos em Copacabana, praia e musica - fim de tarde a andar com calma. Ontem foi Ipanema, onde fomos às rochas antes do Forte que divide as duas praias de forma autoritária - isto é, só dando a volta por trás dele se pode fazer a ligação natural entre as duas. Calor e turismo mas nada excessivo. Bom gosto sim, sem dúvida, ali a cidade é. Se afirma sem pretensão e com natural sedução: a cidade maravilhosa.
Mas nada mais de cidade maravilhosa. Pois nos morros crescem colmeias de gente: trabalhadores, assaltantes e mendigos - como na parte de baixo afinal. Ali onde tudo vive em R/C, onde o prédio - se o houver - é ilegal, a cidade é outra e a dor e a alegria são uma só nota dessa cultura artística, de lidar com as incoerências enérgicas desta cidade de tom ocidental, gritando alegorias tropicais e distantes. Calor acorda tanto a paixão como a violência, tanto a vontade de viver como a de enlouquecer, morrer. Seja. Não, aqui não dorme a possibilidade de morrer que em Lisboa é o tom de vida - melancolia enternecida pela conversa diária da família... Oh, aqui, por mais que a haja, o ritmo da cidade grita mais alto. "Se não tem dinheiro a vida é foda!" E é, porque aqui ter dinheiro é estar na rua, ser com os outros e parecer certo, contínuo amanhã. Continuar é a coisa, pois a possibilidade de vingar é de longe, crença. É dura a vida no Rio. Mais dura ainda pela necessidade de tanto sorrir para que as incoerências não cresçam em cima de ti. Palavras e algum dramatismo português, admito-o por excelência mas assim o sinto. Pressão e sorrisos.
Jantamos a ver televisão, primeiro os Simpsons, depois "A Hora da Aventura"... Não do meu agrado mas do agrado dele e dele que gosto, gosto também disto que vejo. Depois rua, uma cerveja antes do ensaio da banda. Duas horas ensaiaram e eu sozinho vi o que pensava e ouvi as musicas desse telemóvel moderno, actual que guarda memórias do passado, meu ancestral físico - demais não é bom mas um pouco situa o coração. Duas horas dizia eu. Sim, duas horas a beber cerveja por conta própria, sendo olhado sem poder olhar de volta. A solidão é o desporto do qual sou olímpico! Muito movimento - mental - requer a solidão. E por mais que a queira fugir nos dias de hoje, é ela que me guarda em conforto de ser eu e ser por mim um fim, afinal. Depois das duas horas fui ao estúdio mas, de porta fechada e campaínha apertada, me não abriram espaço. Voltei então para casa, sozinho, pelas ruas vazias de um Rio de Janeiro triste e trabalhador, pobre, sem dúvida. Mete medo andar por aí, sem aqueles sorrisos e conversa fáceis tão característicos... Não é cidade que ame a solidão como a minha amada Lisboa.
Em casa já, mãe dele à frente do computador, a falar que o professor, já velho, também não sabe como mandar os ficheiros por correio electrónico. Tentei ajudar mas me pareceu que sabe tanto como eu. Fui lá para baixo então - sendo que o computador dela jaz onde este corpo tem dormido. Escrevo então na sala de família - que indicado! Escrevo isto que escrevo sem qualquer intuito artístico - graças a deus! Escrevo por escrever e porque é o vício primordial que me escolheu. Escrevo por hábito da companhia serem letras e do pensamento fluir livre de outras perspectivas alienadas ao meu.
Chegou ele. Chegou e foi um bom ensaio. Sexta-feira é show no Belo Horizonte. Vão de avião, passagem paga, cem reais para cada... Não dá para viver mas dá para manter. Assim vai a vida no Brasil. Não só no Brasil mas para todo o mundo que vive no querer e fazer. A subsistência acaba por ser a arte do prazer. Não querer muito mas fazer muito e receber o pouco que nos faz manter a crer. Ser.
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