Oh, sempre que estabeleço o começo
logo de fim me entretenho
chegando a não fazer
sequer ser.
E na pressa de querer e querer
me estorvo tanto
que canso maneira de ser
deixando de o saber.
Quero encontrar oxigénio que me mame a vida
perdida.
Tento-a a encontrar
- perdido que estou sem meu próprio amado lar.
A minha cabecinha,
oh, a minha cabecinha está maluquinha...
Quero saber de novidades do mundo,
cair-me ao chão da realidade pura e crua
e olhar, de olhos abertos, vida nova!
Oh, que pena que tenho de saber
que sou assim,
obsessivo e ressentido,
escravo do comboio rápido
que me leva sempre a nenhum lado:
tudo!
Saí ontem,
oh, saí certamente!
Bebi bem e conversei loucuras
e conversaram-me a mim também.
Noite de loucos serena,
com alegria e alguma fantasia,
descobrimos entendimento e
relativamente feliz fui para a cama.
Mas tendo de acordar cedo
para estar na roda dentada desta economia deficiente
tive uma ressaca de infernos,
culpabilidades e estranhas coisas do passado
que ainda remoinham minha cabecinha.
Porque, meu amigo,
se eu não estou a fazer algo efectivamente
então minha mente me mata em prol de sua ânsia de criação.
E querem que arranje melhor trabalho,
melhor ofício para o futuro
mas eu, de momento,
meu querido amigo,
vejo tão pouco esse futuro...
Quero e quero
mas sem disciplina
amanso em lodo de preguiça
sem crença,
sem ânsia.
À porrada vive a minha mente.
E se não uso essa porrada para a arte
- disciplina da loucura -
a porrada me vem a mim,
concreta e tão certamente a mim,
no âmago de mim,
na profundeza do meu coração
de criança homem
que chora o saber demais
para poder ser apenas
e feliz.
Minha voz,
meus olhos e minha crença
são e devem ser honras a um tal deus
que não sei mas sinto ou senti.
De momento,
perdido,
encontro sofrimento
e como ele se mantém sempre que dele tento fugir,
decido ficar nele.
Qual a solução?
Estou sempre tão cheio de morte dentro
que a única solução é gritar violentamente vida.
Mas a violência fugiu-me meu amigo.
E sem violência não fala
a doce alma neste mundo.
Porque a doce alma só pode existir e persistir
naquele que de violência fez defesa metafísica
para o espiritual.
Porque é o espírito que é.
E se se perde ele ou isso
o que é de nós?
Espantalhos que recebem e gastam dinheiro,
fogem ao que têm medo e adiam a verdadeira sua voz.
Cansado de tudo isto,
cansado afinal de tanto me ter de dar
para me sentir, enfim, feliz aqui.
E quando me cansam
eu me canso
e o cansaço
todos sabemos
não levar a nenhum lado.
Prezo a violência porque é
a única que rebenta com as fraquezas
que nascem de ser meramente sensível.
Minha mãe fez-me assim.
Meu pai orgulha-se de mim.
Mas não estando eu orgulhoso
desprezo tudo isto e mais aquele todo:
afectos e carinhos.
Estou venenoso.
E sei que assim sou
quando não satisfeito comigo,
quando não perspicaz e rápido,
insensível às fraquezas de me dar todo ao mundo.
Eu quero a comunicação pah!
Eu quero perceber-te
e contactar com a alegria de saber
que o momento que se vive Agora
nunca mais vai ser.
Eu procuro saber
mesmo que tu estejas
na desgraça de viver uma vida excessivamente material.
É que eu sou espiritual
e só assim me prezo.
Quando entra a desgraça do mundo actual em mim
e quebra as sintonias nítidas e lindas de minha cabecinha
eu fico louco pah,
louco caralho!
Porque o que é o mundo
a tudo o que eu já inventei,
soube, sei?
Fiz e faço de minha existência
plataforma de inteligência universal
de vivos e mortos,
música e ciência,
cultura e religião,
família e amigos e desconhecidos familiares:
raça humana!
Porque sei sermos todos um!
Sei ser esta coisa de minha cabeça idiota
uma mentira instintiva para eu não continuar
meu caminho diabólico de nos conhecer a todos
Agora!
Sabias que vais morrer?
Entendes isso?
Hoje, amanhã ou depois
tu vais morrer.
É curioso...
Tive absolutamente consciente disso
durante bastante tempo ainda
mas depois caí-me em orgulhos e egos
e perdi-me.
Perdido meu irmão.
Quero amor mas não o consigo deixar sentir ou vir.
Estou venenoso,
já o disse...
Admiro todo o ser humano que vive com habilidade,
medos e ansiedades.
Quero ser como vós
mas estou perdido num cansaço antigo
que talvez hereditário e tal
mas é meu,
agora também.
O quanto gosto de ser
- quando consigo -
como vós!
O quanto admiro todo o ser humano que vejo mover-se
e, não sabendo, estar a ser (para mim).
Como um grande palco a vida se me evidencia
e isto que vejo e sinto e escrevo e sou
não quero perder
- não posso perder.
Daí a minha ânsia de querer estar por aí
vivendo cada momento até ao ínfimo detalhe.
E o resto?
E o resto...
O resto é o resto.
Minha vida é sagrada
e toda a vida o é.
Não querer perder essa crença na vida
é como gloriosamente se pode e deve ser.
Até amanhã.
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