segunda-feira, 14 de julho de 2014

Nasci estrangeiro:
tudo me é estranho, curioso.

Nasci fora de mim
e quero lá voltar.
Mas onde?
Voltar onde se nasci estrangeiro?

Ando pela minha Lisboa
e o que vejo é uma enorme aldeia
cheia de velhos e família.
Ninguém se mexe e todos
sorriem com alegria
(mesmo que forçosamente).

Há demais nesta cidade
ou de menos nela integrado.

Visito-a quase todos os dias.
Sou dos arredores então:
onde há praia, vento e pássaros.

Não sei o que fazer desta alma
que não acalma.
Não quer nada depois de pensado
- mastigado, está digerido
embora que só mentalmente...

Que coisa parva deixar-me levar
por tal romantismo; esta coisa epicurista
de viver sem querer, num prazer tão moderado,
com coordenadas bem estruturadas e ínfimas.

Mas há qualquer coisa,
qualquer coisa misteriosa,
que insiste que a pensemos,
que a sejamos.  

(Sinto isto porque não tenho mais nada que fazer...)

Pois isto não pode ser.

Até a inspiração se esfuma.
Pois, para quê inventar
se há o café, a conversa simpática
e a atenção atenta de quem nos quer
por teimosia?

Oh, caio de novo neste absurdo.

Faz rir, é certo,
mas isto porque é absurdo.

Nasci aqui
mas podia ter nascido em qualquer lado.

Talvez em qualquer lado
me sentiria um estrangeiro igual
ao daqui.

Sentir-se estrangeiro
no país que o viu nascer
é, afinal, sentir diferente:
sentir singularmente.

Pois, é isso,
exactamente.

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